11 março 2007

Vindima

"[...]No retalho da encosta vindimada o luar avolumava a tristeza das videiras sem uvas. As vides erguiam para o céu as varas vazias, desfolhadas, como num protesto. A terra pisada e babada de sumo tinha também um ar violado e descomposto. Ao lado do talhão que se seguia, inteiro, túmido e fechado, quase todo de bastardo e com bagos unidos e perfumados, o que ficara colhido parecia um bocado maldito do mundo por onde a desgraça passara. À medida que as navalhas avançavam, as vinhas iam perdendo a graça, a força e a virgindade. E com esta desolação morria também um pouco da alegria dos vindimadores, que chegavam da Montanha sem sono, a cantar e a dançar, e que agora dormiam como lages.[...]"
Vindima - Miguel Torga


4 comentários:

koolricky disse...

Lindo!

Bruno Direito dos Santos disse...

Lindo Douro!

Francisco Rodrigues disse...

Estou a ler este livro do Miguel Torga, Vindima. Li este parágrafo ainda, podemos considerar, no início do romance. Achei extraordinárias estas palavras do poeta da montanha, por isso o post.

Pedro Morgado disse...

Lindo.

O Miguel está entre os melhores de Portugal.

É nestes interlúdios que dá gosto ser português.