08 junho 2007

O princípio do fim da polémica?

in Público

Cientistas obtêm células estaminais embrionárias sem recorrer a embriões
06.06.2007 - 18h29 Ana Gerschenfeld

(...) As células estaminais embrionárias (CEE) são células que, como o seu nome indica, estão presentes durante a fase embrionária da vida. Tanto nos ratinhos como nos humanos, são células "pluripotentes" — isto é, têm a capacidade única de dar origem a qualquer tecido do organismo.

As CEE têm, na opinião dos especialistas do mundo inteiro, grandes potencialidades terapêuticas, pois poderão permitir criar tecidos sãos para substituir tecidos doentes (...). O método é simples: colhe-se uma célula cutânea a um doente, clona-se um embrião a partir dessa célula (com uma técnica como a que permitiu clonar a ovelha Dolly), extraem-se as CEE do embrião e gera-se com elas o que se quer: células beta do pâncreas para tratar a diabetes, células estaminais do sangue contra as leucemias, neurónios motores contra a doença de Parkinson...

Mas eis o problema: a obtenção de CEE passa necessariamente pela utilização de ovócitos, pela clonagem de embriões e a sua destruição — donde o rótulo de "clonagem terapêutica" dado a esta abordagem. E quem diz clonagem humana — mesmo que não se trate de fazer nascer bebés clonados — diz implicações éticas e debates intermináveis. Os resultados de hoje podem vir a resolver o impasse.

Reprogramar células adultas

No principal artigo, publicado na "Cell Stem Cells", a equipa de Kathrin Plath, da Universidade da Califórnia, e colegas de Harvard, anunciam que conseguiram, através de manipulações genéticas, reprogramar células da pele de ratinhos adultos, obrigando-as a "recuar no tempo" até às origens para se tornarem em tudo semelhantes às CEE verdadeiras.

Já se sabia, desde Agosto do ano passado, que bastava activar quatro genes nas células da pele de ratinhos adultos para elas voltarem a ser pluripotentes (resultados aliás obtidos pelos autores de um dos artigos da Nature). E o que a equipa de Plath fez agora, com a ajuda de vírus que infectam as células de ratinho, foi activar esses quatro genes (chamados Oct4, Sox2, c-Myc e Klf4).

O passo seguinte consistiu numa bateria de testes que provou de forma convincente que as células reprogramadas conseguem dar origem a todas as células e tecidos de ratinho. Uma outra equipa relata na "Nature" que conseguiu mesmo fazer nascer ratinhos a partir do ADN das células reprogramadas.

Plath e os seus colegas estão a tentar recriar o fenómeno em células humanas — o que poderá demorar ainda uns anos.

É com grande alegria que recebo estas notícias. No entanto, é preciso ter calma. Durante o desenvolvimento embrionário 90% dos genes presentes no genoma são silenciados pelo método de metilação de bases azotadas e é por isso que a clonagem com células adultas é muito limitada. A concordância quanto aos 4 genes referidos no artigo não é total mas se este estudo (e os outros que lhe deram origem) não desvenda toda a verdade, certamente deu-nos um avanço determinante, no que se refere à investigação de células estaminais!

Agora será que a ética e os grupos retrógrados de velhos do Restelo nos vão deixar fazer essa mesma investigação em células humanas? É porque, para validar os resultados em células adultas têm necessariamente que ser usadas células embrionárias, pelo menos para controle da experiência. É caso para dizer, irá a ética atrasar o progresso científico mais uma vez?



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